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Manzano: É preciso limitar as despesas com juros


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Por Marcelo Manzano
Para a Fundação Perseu Abramo 

A Inglaterra é reconhecida como o berço do liberalismo econômico. Londres, há pelo menos três séculos, é a capital financeira do mundo, centro nevrálgico das operações de reciclagem e multiplicação da “bufunfa” dos ricos, sejam eles garbosos jogadores de críquete, traficantes de escravos ou apenas donos de grifes manufaturadas no submundo de Bangladesh.

Nem por isso, contudo, as autoridades britânicas toleram que as taxas de juros praticadas naquela pequena ilha flutuem livremente ao bel prazer do mercado. Cientes que entre um credor e um devedor há uma abissal diferença de poder, em janeiro de 2015 a agência britânica de fiscalização do setor financeiro (FCA na sigla em inglês) fez valer uma lei que simplesmente impõe um mínimo de bom senso ao delírio usurário que empanturra o bornal dos banqueiros dos arredores do Palácio de Buckingham.

Vejam do que foi capaz a FCA: além de fixar um teto para a taxa de juros diárias nos empréstimos (0,8% ao dia), estabeleceu que aos mutuários que não pagarem seus empréstimos em dia se poderá aplicar uma multa de no máximo £15 (algo como 60 reais) por empréstimo, independentemente do tempo de atraso e do valor do total emprestado.

Como se não bastasse, sem muita fleuma, a FCA estabeleceu que o mutuário estará desobrigado de pagar juros, multas e taxas administrativas cuja soma ultrapasse 100% do valor original do empréstimo. Ou seja, ninguém no Reino Unido é obrigado a pagar mais do que o dobro do que pegou emprestado. Simples assim. Nem por isso a rainha perdeu a coroa, nem a frenética City londrina emperrou.

Já do lado de cá, paraíso tropical do rentismo, a chapa está queimando. Com a economia funcionando por aparelhos, a inflação no chão e os juros básicos escorregando lentamente para níveis civilizados, os próprios porta-vozes do mercado se remexem nas poltronas para explicar a incrível permanência dos elevados “spreads” (ganhos dos bancos) bancários que mantém as taxas de juros ao tomador final em altura de dar inveja a urubu. No famigerado “cheque especial” ou no salgado rotativo do cartão de crédito, chega-se a cobrar dos infelizes devedores taxas superiores a 500% ao ano! Isto é, seis vezes o montante inicial emprestado.

Para enfrentar o problema, tem se falado muito na elevada concentração bancária no Brasil como causa principal desse desatino financeiro. De fato, temos poucos bancos em nosso país. Mas o próprio exemplo da City londrina, onde muitos bancos sentam praça sem que um incomode a rentabilidade do outro, demostra que o problema não é de quantidade nem de concorrência, mas sim de falta de regulação.
No caso do Brasil, embora não tenhamos uma agência reguladora com o pulso da FCA britânica, dispomos da vantagem de ainda contar com dois robustos bancos de varejo sob controle do governo central – Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal.

Não estivessem entregues a uma gestão afinada com os interesses dos bancos privados, deveriam ser utilizados para forçar a queda das taxas de juros via concorrência direta. Se BB e CEF reduzissem suas taxas, para não perder a clientela os três grandes privados certamente viriam atrás, e nem por isso deixariam de lucrar aqui mais do que lucram no resto do mundo. Não custa recordar que tanto no governo Lula (no pós-crise de 2008), quanto no primeiro governo Dilma, esse expediente foi utilizado com sucesso, fazendo o crédito ao consumidor cair a patamares bastante baixos para o padrão brasileiro.

É verdade que, como alguém com razão haverá de lembrar, esse talvez tenha sido o maior incomodo da classe rentista com os governos do PT e um dos principais motivos da virada de mesa que desmontou o Brasil nos últimos anos. Entretanto, parece certo que ainda assim o rentismo nativo deverá preferir a concorrência dos bancos estatais à adoção do teto de juros que vigora entre os britânicos para impedir a prática desumana da usura.

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