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Artigo defende tributos globais contra a desigualdade

Estudo apresentado pelo pesquisador Francisco Mata Machado é um dos vencedores de edital de 2021 do Instituto Lula


Artigo defende tributos globais contra a desigualdade

Reprodução

Estudo apresentado pelo pesquisador Francisco Mata Machado é um dos vencedores de edital de 2021 do Instituto Lula

A utilização de tributos globais para a redução da pobreza e combate à desigualdade. Esse foi assunto apresentado em webinário  na noite da quarta-feira (24) pelo pesquisador Francisco Mata Machado, professor da Faculdade de Direito na Universidade Federal de Goiás (UFG), mestre e doutor em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Esse artigo é um dos vencedores de edital do Instituto Lula  de 2021 no âmbito do Ciclo de Estudos e Pesquisas sobre Novas e Velhas Desigualdades na Era Digital. Os comentários foram feitos pelo doutor em Economia Guilherme Melo, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

O pesquisador iniciou comentando os processos de retrocesso democrático em escala global e autores que consideram a “participação popular em demasia” responsável pela ascendência de populistas que desmantelam instituições intermediárias como os partidos.

Machado ressaltou ainda as diferenças de acesso a direitos sociais, estabilidade política e econômica, segurança alimentar estão relacionadas principalmente ao local onde as pessoas nascem. “As diferenças entre o norte global e o sul global são cada vez mais pronunciadas”, disse. “No contexto da crise sanitária isso fica ainda mais claro. Basta dizer que 66,3% da humanidade recebeu pelo menos uma dose de vacina contra a covid, mas nos países de baixa renda são apenas 17%. Um mundo profundamente desigual do ponto de vista socioeconômico.”

Medidas redistributivas

Nesse mundo, observa o professor, medidas redistributivas como tributos parecem não funcionar de maneira esperada. “Estudos do FMI (Fundo Monetário Internacional) indicam que pelo menos 600 bilhões de dólares são perdidos anualmente apenas para paraísos fiscais, uma das formas de evasão fiscal em escala global.”  E o mais grave: desses 600 bilhões, 200 bilhões dessa evasão dizem respeito a países pobres. 

Além de paraísos fiscais, há cada vez mais um regime de propriedade intelectual que permite a grandes corporações remeterem valores, a título de royalties, para suas matrizes evitando tributação onde ocorrem suas atividades.

“Nesse contexto percebe-se que não há uma queda da arrecadação tributária global  necessariamente, mas um claro deslocamento. Corporações, grandes riquezas, transferências de heranças de doações, propriedade, capital, são cada vez menos tributados. Trabalho, consumo, atos econômicos praticados por pessoas que têm apenas sua força de trabalho para vender: isso é cada vez mais tributado.”

Assim, diante desse cenário, aumentam as desigualdades. O pesquisador relata, ainda, tentativas da OCDE de resolver esse problema global com a criação de alíquotas mínimas para tributação sobre corporações, praticas de transparência do que arrecadam em cada localidade. Formas consideradas limitadas e problemática do ponto de vista político como se coubesse ao Norte global civilizar o Sul e pensar políticas de harmonização fiscal adequadas.

“Talvez faça sentido (essas medidas) temporário sob o prisma da redução de pobreza em algumas localidades. Mas quando fala em desigualdades e democratização são mais parte do problema que da solução.”

Tributos globais

O que parece funcionar, avalia ele em seu estudo, está na forte correlação entre implementação de tributos – principalmente progressivos –, processo de democratização e redução da desigualdade.  E lembra estudos que indicam que a implementação de tributos progressivos em países da América Latina. Isso altera o comportamento dos agentes econômicos, o que permite redução de desigualdade para além do efeito distributivo direto do tributo tirando recursos de um lugar e colocando em outro.

Para além disso, informa o pesquisador, estudos norte-americanos de moralidade fiscal indicam que as pessoas cada vez mais reconhecem a legitimidade da obrigação tributária, entendem que ricos devem pagar mais e estão dispostas a votar em candidaturas que digam coisas como colocar risco no imposto de renda e pobres no orçamento. No Brasil isso ainda não é medido.

Tributos em escala global, assim, poderiam ser soluções interessantes para redução da desigualdade. “Pode ser uma resposta alcançando-se as grandes corporações transnacionais que nesse momento escapam ao Fisco e incluindo o Sul global nos respectivos processos decisórios”, defende no artigo, exemplificando. “Tributos sobre carbono, sobre passagem de avião, sobre operações financeiras, sobre riqueza e renda global.”

Essa proposta, no entanto, segue rechaçada e não se encontra em nenhuma agenda oficial.  O pesquisador propõe medidas como elevar esse debate ao mesmo nível do que foi feito com o meio ambiente em escala internacional. O debate lembra, ainda, a relevância do assunto durante os governos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cuja agenda priorizava a construção de espaços globais democráticos e representativos de negociação. Acompanhe:


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